Quando o movimento de negócios sociais começou de forma mais concreta no Brasil em 2006/2007, discutia-se muito os modelos de governança das organizações. Com a dificuldade de viabilizar financeiramente as empresas sociais essa discussão ficou em segundo plano. Uma decisão inteligente, pois não era muito útil colocar vários critérios para reconhecer uma organização como negócio social se ela fosse existir apenas por um ou dois anos. A Artemisia acompanhou este processo com vários dos empreendimentos apoiados.
No entanto, com a evolução das empresas sociais a governança volta a ser relevante. Um modelo de governança adequado contribui para o negócio não perder o foco no impacto socioambiental. O desafio é que o modelo de governança não depende da vontade de uma ou duas pessoas. A governança é determinada pelas relações de poder entre os públicos de interesse e isso é um processo dinâmico que deve ser pensado e construído desde o início da organização (mesmo não sendo o foco nos primeiros anos). A governança compreende os processos, as políticas e a estrutura de tomada de decisão de uma instituição.
Os modelos disponíveis no mercado para pensar em governança são muito limitados. Mesmo quando buscam envolver mais os outros públicos de interesse, as relações entre eles ainda são presas em paradigmas antigos, como a ideia de que os investidores devem ter mais poder. A Natura é um exemplo de uma empresa que procura criar relações diferenciadas com seus públicos, entretanto pelo tamanho e cultura da organização é muito difícil implementar um modelo mais participativo.
Os negócios sociais têm a oportunidade de criar modelos mais ousados de governança, pois já nascem com um novo DNA ligado a valores de co-criação, colaboração e participação. Mesmo que no início a organização foque em viabilizar sua operação financeiramente é importante começar a desenvolver um modelo de governança, pois isso no futuro pode ser decisivo para a continuação da empresa. Mais uma vez, o desafio dos negócios sociais é criar um paradigma mais equilibrado, que não seja lento e complicado como algumas associações, nem autoritário e desigual como algumas empresas. A equação é desenvolver uma governança participativa com uma gestão ágil, que entregue os resultados socioambientais prometidos.
Definitivamente, não é uma tarefa fácil. Na Tekoha temos tentado construir esse modelo e continuamos com muitos desafios (é bom lembrar que mesmo as organizações com o modelo “padrão” de governança estão com muitos problemas). Atualmente nos organizamos nos seguintes grupos: (i) as comunidades que são os fornecedores da Tekoha (cooperar com essas comunidades é a razão de ser da Tekoha); (ii) os clientes formado por pessoas físicas (varejo) e médias e grandes empresas (atacado); (iii) os colaboradores que operam e gerenciam a organização com autonomia; (iv) os sócios, grupo formado por colaboradores ou ex-colaboradores da organização; (v) o conselho consultivo, formado por experts em áreas relevantes para a Tekoha; e (vi) o conselho dos investidores que têm participação nos resultados de longo prazo da empresa (mas sem poder deliberativo). Desde o início tentamos implementar vários modelos participativos e a maioria falhou, mas continuamos buscando forma inovadoras de fazer a governança e a gestão da organização. Acreditamos que a busca por um modelo novo, já cria uma cultura diferente e mais participativa. Um sonho que temos é envolver algumas comunidades no nosso conselho ou criar um conselho das comunidades. No início isso parecia impensável, mas agora começamos a criar estruturas e parcerias que podem nos ajudar a implementar esse modelo no futuro.
No The Hub Internacional passamos por várias mudanças até chegar em uma estrutura mais participativa. Atualmente existe uma associação formada por todos os Hubs no mundo (20+) que é controladora de uma empresa que atua como “franqueadora” dos Hubs, prestando serviços, criando processos e facilitando a cooperação entre os Hubs. Dessa forma invertemos a lógica e os “franqueados” passaram a ser donos e controlar o “franqueador”. Estou usando estes termos franqueado e franqueador como referência, mas acreditamos que o modelo que estamos criando é novo e com isso novos nomes surgirão no futuro.
Não acredito numa resposta pronta ou um modelo a ser replicado. O desafio é criar modelos de governança e gestão ágeis que potencializem a participação de todos os públicos de interesse e estejam focados na geração de impacto socioambiental positivo.
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